quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

II - Gelo Fino

A cada ano que passa, as luzes de Natal aparecem mais cedo. Os enfeites nas lojas de departamento, as promoções nas lojas dos shoppings, as ceias, os presentes, as árvores ornamentadas.

Uma vez ouvi que a Véspera de Natal é a noite do ano com o maior número de suicídios. Se você passar por ela, é bem provável que termine o ano vivo. E eu já vou rumo ao meu vigésimo segundo natal.

E assim como as luzes e adornos aparecem cada vez mais cedo, a cada ano meu nervosismo chega mais e mais cedo. Há dois anos, foi na primeira semana de Dezembro, ano passado, na última semana de Novembro. Nesse ano, o Natal já batia na minha porta no final de Outubro.

E não, eu não gosto do Natal. Assim como não gosto dos meus aniversários. Eles criam muita expectativa sobre datas que nunca mais serão como antes. Depois que eu cresci, natais e aniversários se tornaram uma fonte gigante de desapontamento. Prefiro não comemorar nenhum deles.

Acredito que é sábio dizer que isso é crescer e amadurecer: ver seus heróis se tornarem humanos, ver a química por trás da mágica, descobrir que é tudo um jogo de luzes, ilusão. O mascote do parque é só um anão dentro de uma fantasia idiota. O balcão do bar ficou mais interessante do que o Fliperama.

Me resta bater em retirada, esperar o Natal acabar, esperar o fim do ano e continuar acreditando que se eu conseguir manter o queixo acima da água por um pouco mais, afinal, chegarei em algum lugar onde possa sair da água enquanto eu luto contra parte de mim - e de tudo ao meu redor - que secretamente quer que eu afunde sem volta.

Sussurros de mares de inverno chamando meu nome enquanto eu durmo.

O Natal vai passar. E depois dele, o ano novo. E tenho pensado em fazer diferente. Vestir negro e beber mais e falar menos. Pensar menos. Tudo e qualquer coisa que eu possa fazer para colocar uma parede entre mim e essa besteira. É tudo o que eu posso fazer, sobreviver ao fim do ano

Até lá, eu espero que tenhamos uma jornada libertadora. Até lá, espero poder caminhar sobre gelo fino e rezar para qualquer deus que possa me ouvir para que ele não se quebre debaixo dos meus pés cansados.

E quando eu penso que ouvi um estalo ou um rangido, eu tento me apressar e tomar uma direção segura só para me lembrar do óbvio: você nunca sabe em que ponto o gelo é mais fino.

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