sábado, 28 de novembro de 2015

Os meus ratos no porão.

Acho engraçado como nós não nos desapegamos facilmente de velhos hábitos. Já há muitos anos não sou mais um católico praticante. Há um bom tempo sequer tenho fé ou religião. Há alguns meses descobri que não me importo mais. Mesmo assim, ainda faço o sinal da cruz quase sempre quando passo por uma igreja.

Eu já não me sinto mais tão mal durante as aulas na faculdade, mas ainda tenho que me sentar de costas para a parede para não surtar com a possibilidade de ter alguém me observando de um lugar onde eu não possa vê-lo(a). Eu já não me sinto tão desajustado em relação a tudo e fora de lugar o tempo todo, mas se eu estiver sóbrio ainda tenho ataques de ansiedade em lugares lotados, em shoppings, em shows, em bares, em festas. E até em casa sozinho no meio da madrugada.

Não consigo deixar de pensar na história de pessoas que tem membros amputados, mas juram que ainda podem senti-los. Eu sou um homem sem pernas mexendo os dedos do pé.

Ainda temo pelos ratos no porão mesmo sabendo que não há mais nenhum deles lá. na verdade, não há porão algum.

Talvez seja o medo de mim mesmo que me torne constantemente execrável. Talvez eu esteja doente esse tempo todo e por isso tudo que eu penso, falo, escrevo e faço me soa cada vez mais patético e vergonhoso. Mas ainda estou aqui.

Eu já me sinto em casa em muitos lugares, mas não chego abrindo a geladeira e pondo os pés sobre a mesa. Questão de hábito ou vício, maneirismos ou filosofias. Eu ainda odeio a pessoa que eu vejo no reflexo do espelho do banheiro pois ela tenta ser algo que não é para evitar a realidade de sua insignificância. Até eu preciso estar ébrio pra me suportar, não posso julgar quem faz o mesmo.

Tenho divagado demais, me adiado demais, me criticado demais. No final, talvez seja porque eu goste, talvez seja parte da minha identidade sentar de costas para a parede. Talvez eu apenas goste de igrejas. Talvez a inaptidão seja parte de um conjunto de hábitos, e não uma característica. Até porque, ainda acho espaço para a arrogância e prepotência num mar de auto-consciência, auto-destruição.

Estou derrubando meus muros, meus dilemas morais, meus paradoxos éticos. Cansei dos velhos tecnicismos, da burocracia dos meus códigos de conduta. Mas ainda sinto cometendo algo de errado numa madrugada de Domingo quando todo meu corpo me diz estar cometendo um crime que minha mente não consegue enxergar.

Ainda faço o sinal da cruz quando passo por uma igreja. Ainda me deixo acreditar estar mais triste do que realmente estou. Ainda preso a pessoas que não amo mais. Ainda perseguindo fantasmas que sei que não existem. Ainda me vejo vítima de suicídios que eu sei que não vou cometer.

Sou escravo de meus próprios dogmas. E nada mais