terça-feira, 10 de setembro de 2013

Devoção

Aceno pro Garçom e peço a conta imaginando como as pessoas me enxergam tomando um chopp sozinho na mesa do canto. Ali, alheio à mistura da música ambiente e as conversas em outras mesas. Meu santuário, minha prece. O caminho de volta pra casa - como sempre, a pé - é aquele mesmo de sempre com as mãos no bolso da blusa, os olhos fitando o pavimento da calçada, som dos meus passos na rua deserta em fim de noite. Esse é o meu calvário.

Alguns passam, alguns olham, mas ninguém nota.

Chego em casa e nenhuma história pra contar. Sento no sofá, ligo a televisão e espero ela me sintonizar. Ninguém vai entender nada disso. Não fico na frente dela nem por dez minutos, recorro à janela da sala. Acender um cigarro e observar a vizinhança durante a madrugada. É o mesmo ritual de sempre.

Trago a trago, a noite acaba. É só isso mesmo e mais nada. Olho pra baixo e lamento o fato de morar no quarto andar. Se fosse o oitavo ou o décimo, quem sabe, a janela tornar-se-ia uma saída de emergência pro pátio central. E o que sobrasse de mim traumatizaria as crianças saindo de manhã para ir pra escola. Assim me tornaria mais um mártir.

Quem sabe um dia, hoje não. Hoje me contento com o que estiver passando na televisão. Pelo menos enquanto não encontro outro santo pra mostrar minha devoção.

É dez de Setembro, lembro que o inverno não acabou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário