sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Desejos

Hoje me ofereceram uma flor, e com ela, um desejo. Qualquer um, qualquer coisa. Bastava desejar jogar fora flor depois de pedir o que eu quisesse.

A princípio, não soube o que pedir. Sou um homem sem fé, sem ambição e sem propósito. Não tem quase nada que pudesse preencher o vazio do meu eu. Não há nada que eu possa desejar que vá me tornar, de fato, pleno.

Eu estava sonolento, pensei por horas que, se realmente funcionasse, eu simplesmente não saberia qual seria a melhor escolha. Nem sabia quais escolhas eu tinha. Meu próprio conceito de felicidade inexiste diante da luz da realidade. Se o contentamento fosse um deus, eu seria o mais cético homem a pisar na terra.

Foi quando eu enxerguei o óbvio. Algo que, muitas vezes, as cortinasde fumaça da minha mente não me permitem ver.

Queria jogar a flor em água corrente. Imaginei um rio de águas claras. Me contentei com a turva lama que descia junto ao meio fio.

Desejei a morte do demônio que habita em minha corrente sanguínea. Desejei o fim dos pesadelos e o retorno das boas noites de sono. Desejei que os muros que construí em volta de meu castelo desabassem. Desejei saber descartar como já fui descartado. Desejei não mais ver o mundo através de um filtro cinza dos que usam nos filmes de drama e reduzem a saturação de toda cor. Desejei que o amarelo fosse vibrante, que o vermelho fosse vivo, que o azul fosse acolhedor.

Desejei não um caminho fácil, mas apenas saber a direção. Não desejei qualidades, mas que calassem meus defeitos. E que se calassem todos, por um instante.

Desejei que sentissem a minha dor por uma hora. Assim, imaginariam como é difícil conviver com ela por anos. E queria que sentissem a minha raiva por um minuto e me dissessem até onde ela não os poderia levar.

Desejei não mais sentir nojo do que vejo no espelho e não mais me ver nas letras de todas aquelas músicas tristes.

Fiz o único pedido que faria minha vida ter sentido de novo.

Desejei ser outra pessoa. E nunca mais ouvir minha própria voz dentro da minha cabeça.

Desejei cantar afinado no coro da vida sem nunca perceber que há uma música tocando. E não mais apreciar a melodia em cada fútil detalhe sem nunca alcançar as notas certas.

Desejei ser normal.  Não no sentido ordinário do termo. Mas simplesmente conseguir fazer o que todos fazem.

Apenas quis sorrir sem forçar. Apenas quis rir nas horas certas. Apenas quis enxergar o romance além da tragédia. Só quis acordar amanhã e sentir vontade de levantar da cama.

Desejei que linhas amarelas não significassem nada pra mim.

Desejei que pudesse ver a beleza da simplicidade.

Desejei o descanso dessa batalha diária contra todos esses monstros que moram na minha cabeça.

Desejei um motivo para continuar.

Desejei ser você.

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