quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

O Voo de Ícaro

Definitivamente, ele não havia nascido para ser subjugado. Desde pequeno, era subversivo, mal educado, desobediente. Como uma chama que não podia ser extinta, o garoto levava a alcunha de passarinho por sempre querer voar.


E livre foi, tentando viver um dia de cada vez, todos no mesmo dia. Passou pela vida veloz como o mergulho de um falcão carregando em seu peito a inocência de uma doce canção de um sabiá. Evitou fitar o mundo real onde abutres esperavam os rebanhos morrerem de sede para se alimentarem de seus cadáveres.

Temia somente a morte pois entendia esta como o fim definitivo de toda sua liberdade, a flecha que o atingiria em pleno voo e encerraria, assim, todo o seu desejo de conquistar os céus. E a sua obsessão pela liberdade de voar e seu medo da morte que a cada dia estava mais próxima em seu encalço, o levaram a ser considerado como louco e numa noite de Inverno, foi trancafiado num Manicômio.

Ele não poderia suportar o claustro, como pássaro na gaiola, recusava cantar suas belas melodias para seus raptores. Volta e meia tentava escapar, mas nunca conseguiu. Com os anos, a temida morte se aproximou, mas não para levá-lo, apenas para dialogar. Ele entendeu os anseios de sua maior inimiga e percebeu que a vida que levava não poderia ser tão pior que a morte que o assombrava.

E se foi numa tarde de primavera. Subiu no parapeito da janela do quinto andar e jurou para si mesmo que, se pulasse, poderia voar. Pois era um espírito livre e nascera para ser solto como os pássaros que cantam nas árvores. Não era um canário de gaiola qualquer, era uma ave de rapina jovem e arisca procurando lebres nos verdejantes campos de lugar algum.

Então saltou e, até certo ponto, realmente sentiu que estava voando. Até que começou a cair rapidamente. O vento contra seu rosto, o chão ficando mais próximo. Ele tocou o solo e abraçou a mais verdadeira liberdade: livrou-se das amarras da vida que lhe prendiam nesse mundo sujo e corrompido. Entendeu que a morte não era o fim de sua liberdade, mas o início dela.

E entendeu que sepultados estão os vivos que vivem escravos de sua própria ambição.

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